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:: Carreiras - Uma Mulher na Liga...

Toca guitarra e com a sua formação musical chegou a dar aulas a crianças. É natural de Espinho, onde a tradição do voleibol atrai a grande maioria dos jovens. E não foi excepção. Andreia Couto adorava esta prática desportiva mas nunca foi uma atleta federada. Jogava apenas por lazer. “Éramos oito irmãos e tínhamos de encontrar coisas para nos entreter, senão a nossa mãe dava em doida”, recorda, entre gargalhadas. Mas o desporto sempre fez parte da sua vida. Talvez pelos feitos do irmão Fernando Couto, que a passos largos foi galgando terreno nos relvados nacionais e internacionais. “Toda a família, de uma certa forma, aprendeu a gostar de futebol vendo o Fernando a jogar”, comenta, com um inconfundível sotaque do Norte. Andreia Couto ia a todos os jogos em que o irmão participava. Chegou mesmo a viajar para Itália apenas para lhe dar apoio em partidas importantes. Mas entre todos os irmãos só os dois fizeram carreira no futebol.Na realidade, Andreia Couto sente dificuldade em ver-se dissociada do desporto. “O futebol é como… a paixão. No início estranha-se e depois entranha-se”, observa. “Não é só o gosto pela bola dentro de campo e do jogo. O futebol providencia uma espécie de condensação das características da sociedade moderna, que se traduz na própria competição em si, na alternância de vitórias e derrotas, numa necessidade de organização cada vez mais estruturada, numa exigência de resposta rápida”, explica.
Mas a número dois da Liga nunca imaginou que fosse chegar à posição em que se encontra hoje. “Tudo aconteceu fruto de sucessivas coincidências, mais ou menos felizes, dedicação e… estar no sítio certo na hora apropriada”, pensa, a olhar para trás.Direito foi a carreira que escolheu.
Não por tradição familiar, “mas através de uma sucessão natural de situações e oportunidades”. Fez a licenciatura em Direito na Universidade Portucalense e o estágio profissional. Quis mais. Tirou, então, uma pós-graduação em Direito Penal Económico e Europeu e outra em Direito do Desporto na Universidade Lusíada do Porto. E não pretende parar por aí. Acha a formação muito importante e já tem o mestrado no âmbito do Direito do Desporto debaixo de olho. Mas não gosta de fazer muitos planos.
“Quanto mais planeamos menos acontece o que queremos”, afirma.Andreia Couto chegou a trabalhar na área de contencioso do Banco Comercial Português e a exercer a actividade de jurista. Mas os últimos anos foram dedicados inteiramente ao futebol. Em 2002, surgiu um convite para integrar o corpo jurídico da Liga. Aceitou-o, e desde então é à LPFP que se dedica de corpo e alma. Começou pelo departamento jurídico que dava apoio à Comissão Disciplinar e Comissão Executiva. Em 2004, passou a dirigir o departamento de registo de contratos. Dois anos mais tarde, foi nomeada por Valentim Loureiro, então presidente da LPFP, para ocupar o posto de secretário-geral. Agora, desde que Hermínio Loureiro foi eleito presidente da LPFP, Andreia Couto foi convidada a ocupar o lugar de directora-executiva, cargo de enorme responsabilidade naquela entidade.


Dedicada, determinada, mesmo teimosa, Andreia Couto chegou alto no mundo do futebol profissional.

Passar do público para os centros de decisão e organização do futebol não foi complicado. Mas se nas bancadas o futebol é vivido no domínio do lazer, no trabalho, não há espaço para divertimento. Na sua actual função tem de acompanhar todos os procedimentos processuais, logísticos, administrativos e directivos do futebol. Nada deve acontecer na BWIN Liga e na Liga Vitalis que Andreia Couto não saiba, ou pelo menos que não lhe tenha sido dado conhecimento. E o desporto exige prontas respostas.

“Para isso é preciso uma preparação muito grande. Dediquei muito tempo e trabalho a isso”, sublinha.O cargo que desempenha exige um enorme esforço físico e psíquico. “A responsabilidade da decisão é pesada nesta área tão fascinante e complexa. É muito desgastante”, afirma.Ser mulher num universo tão masculino e exigente não a intimida. Andreia Couto não acredita que seja diferente de outros sectores. Mas reconhece que as exigências no futebol podem ser maiores. “Estamos sempre em causa. Não escondo que algumas mentes mais conservadoras suspeitam e criticam: ‘Se corre mal é porque é mulher…’”
A actual direcção da LPFP foi eleita a 10 de Agosto de 2006, tendo tomado posse a 2 de Outubro do mesmo ano. Para Andreia Couto, o trabalho ainda vai a meio, mas já é capaz de assinalar que este tem sido um período de mudança, de transformação e de adaptação a novas atitudes. O êxito é sempre o que pode haver de mais compensador seja qual for o trabalho que se desempenha.
“Nada sabe melhor que uma vitória. Para a Liga, ganhar é ser mais profissional e conseguir andar em frente com reformas estruturantes”, observa. Mas estas reformas não podem ser rápidas nem radicais, sob o risco de fazer morrer a modalidade. “Para fazer vingar as coisas, é preciso ir devagar e ter atenção de adaptar todas as novidades ao nosso futebol, à nossa realidade”, comenta. E já há aspectos que vão sendo alterados. Andreia Couto fala sobretudo dos novos pressupostos de exigência aos clubes e de uma nova forma de ver o futebol – mais organizado e mais profissional, com melhores condições e a proporcionar um melhor espectáculo. “Todos nós sentimos o problema da dificuldade económica do público e, em consequência, do afastamento deste dos estádios”, analisa.Foi sob a gestão da comissão executiva que integra que foi tomada a decisão histórica e polémica de punir grandes clubes e seus presidentes. Mas Andreia Couto prefere não comentar o tema, nem sobre até onde se vai chegar com todo este processo. Mas observa que “a premência da moralização do futebol nasce da mediatização desta actividade e do efeito do futebol na nossa sociedade.
A paixão que o futebol desperta é, muitas vezes, utilizada como elemento alienante dos graves problemas que Portugal e o resto da Europa atravessam”. É assim desde sempre. E o mediatismo do futebol leva a que o seja cada vez mais. A número dois da LPFP, no entanto, compreende que as pessoas precisam de descontrair. Ela própria, com a ajuda do marido, tenta buscar maneiras de se abstrair de uma rotina agora ainda mais endurecida, desde que há cerca de quatro meses nasceu Vicente, o primeiro filho do casal
.O dia-a-dia de Andreia Couto agora é programado de acordo com as exigências normais de um bebé recém-nascido. Com isso, os dias de Andreia Couto começam por volta das 5h30 da madrugada e terminam tarde, muito tarde.
Para descontrair, gosta de ouvir música brasileira e cubana ou lê um livro. Agora deixa-se levar pelas palavras de Salman Rushdie em O Último Suspiro do Mouro, mas, com bom humor, espera que o título do livro não seja interpretado como provocação vinda de uma mulher do Norte.